LOUVA-A-DEUS PREDADORA
Imagem de MCF
Oito horas. O sol começa a raiar no horizonte
À garupa da louva-a-deus predadora - a buldozzer
o homem manipula-lhe mandíbulas automatizadas
ferrando-as no coração da terra
Imperturbável arranca-lhe o húmus, a vida
No acto decorrente, o limoeiro da minha infância
é dilacerado por impiedosas tenazes de titânio
Plantou-o meu avô
fronteiro à janela do meu quarto
Oh, quantas vezes esborrachei o nariz na vidraça
para melhor distinguir o carreirinho de formigas
ora subindo,ora descendo afanosamente
pelo erecto fuste de musgo sarampeado!
Quantas vezes o descarado pintassilgo
no coruto de sua copa
saudava a estrela d'alva com gorjeios melodiosos!
Quantas vezes brisas de calmosas madrugadas de Agosto
impregnaram meu quarto de citrina fragrância!
O terramoto antinatural propaga-se
Por rudes e implacáveis golpes
é demolida minha velhinha casa
Resigno-me
Tudo pelas necessidades futuras - garantem-me
Vejo na maqueta altos edifícios despontando
Alinhados, imponentes,frios, impessoais...
Com relva, muita relva em redor
para mascarar o verde arrancado
Serão habitados por centenas de pessoas
que todos os dias se vêem
e vida fora se desconhecem
A louva-a-deus prossegue num ritmo avassalador
e o espaço mais querido da minha meninice
qual gazela ferida de morte
exala pelas narinas sopro derradeiro
A nuvem de pó esconde por momentos
a máquina e o homem que a opera
Incontidas lágrimas desprendem-se dos meus olhos
orvalhando o limoeiro da minha infância
ainda enraizado no mais fundo de mim
Manuel Correia Fernandes
macofernandes@gmail.com
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